No dia 12 de janeiro de 2017, tem início o 4º Congresso dos Jornalistas. Um evento que deveria servir para mudar o rumo da profissão, para voltar a cravar a dignidade nos jornalistas, no jornalismo. É crucial que esta esperança, que motivou a colaboração entre três organismos (Sindicato dos Jornalistas, Clube dos Jornalistas e Casa da Imprensa), se concretize em algo palpável após o congresso.

Caso contrário, vamos continuar a ter um espaço de lamúrias, uma espécie de consultório onde alguns vão “despejar o saco” para, no final, ficar tudo na mesma.

Os 18 anos de intervalo desde o último congresso têm um grande significado. Manifestações de interesse, conversa, realçar aquilo que já se sabe há anos, pouco mais.

Para afirmar o jornalismo e devolver a dignidade aos jornalistas é preciso agir, de forma rápida e direta. Assumir a organização de um congresso é um passo. Mas, a pergunta que se impõe é: será que a solução está na voz das pessoas que têm “liderado” os meios de comunicação social até agora?

Para Maria Flor Pedroso, jornalista e presidente deste congresso, “é muito importante ter a presença dos diretores” não só porque estiveram “ausentes dos anteriores”, mas também porque “têm uma palavra a dizer”. De facto, é nas mãos das direções que tem estado o passado, presente e futuro da profissão.

Haverá opiniões diversas. Muitos podem concordar com esta tese outros tantos, ou mesmo a maioria, considerar que isto vai mal, mas nada fazem e deixam ficar tudo na mesma. Lembra o futebol onde se tem evitado aderir às tecnologias porque isso retira parte da paixão gerada pela discussão.

Os jornalistas mais seniores, aqueles que ainda estão no ativo, calam-se porque precisam de pagar as contas ao final do mês. Os que ficaram no desemprego, zangados com a profissão, reclamam, mas sentem que nada podem fazer para mudar o rumo.

Os que estão a começar, nada podem fazer perante o clima constante de ameaça à sua continuidade na profissão. Aprendem a ser “domados” (esta expressão está aqui de forma consciente e não pretende ser uma ofensa, mas todos sabem que é disso que se trata) e conformados com a situação.

No entanto, as vozes que se continuam a ouvir e a promover, são as mesmas há mais de uma década.

Maria Flor Pedroso assume a “expectativa de que o congresso possa representar um marco para os jornalistas e jornalismo em Portugal. Chegar a conclusões que possam ter continuidade”. Porque, tal como refere, “nos outros congressos houve conclusões e não se fez nada”.

Este é apenas o princípio. “Se for um ponto de partida para ter ideias mais claras para o futuro, para ter um jornalismo onde todos se possam rever, seria ótimo”, sublinha a presidente do evento.

Um dos temas que vão estar em debate no encontro é a relação dos jornalistas com o exercício da profissão, a escrita em blogues e textos de opinião: “Quais as vantagens e desvantagens do jornalista fazer opinião?” Esta é uma das questões incluídas no programa e que Maria Flor Pedroso realça.

Com razão, porque, muitas vezes, a opinião não passa disso mesmo. Mas, mesmo na opinião, os jornalistas têm a responsabilidade de se basear em factos. É uma opinião diferente da que é, de forma geral, escrita por um político, economista, um cidadão.

A opinião de um jornalista deve possuir um caráter de verdade factual.

Para este artigo, para tentar identificar com alguma certeza que existe uma ausência de união entre jornalistas, era preciso saber quantos se inscreveram e manifestaram interesse em debater a profissão. “Neste momento estão inscritos 600, mas as inscrições estão abertas até ao dia do congresso e ainda há algumas que faltam confirmar o pagamento”, realça Maria Flor Pedroso.

No entanto, o número deverá ficar muito perto destes 600, nem há espaço para muito mais no cinema São Jorge, onde irá decorrer o congresso. Mas, atualmente, há 5522 jornalistas com carteira profissional e 2218 com título provisório.

Sobre o Congresso

Apesar do congresso ter datas de realização entre 12 e 15 de janeiro, as atividades irão ocorrer de domingo, 8, até dia 15. Organizar tudo isto “envolveu uma volta pelo país para ouvir jornalistas, no Porto, Coimbra, Beja, Leiria, Lisboa, para auscultar o que querem que o congresso discuta”, salienta Maria Flor Pedroso.

O resultado deste trabalho acaba por ser visível em três ou quatro níveis de reflexão que vão desde o ciclo de cinema, uma exposição de fotografia, ou as sessões de discussão do congresso propriamente dito. No final, o objetivo em todos estes níveis, afirma a presidente do congresso, “é discutir a comunicação social”.

É uma oportunidade para tentar unir uma classe “que está muito desmotivada, e isto não tem só a ver com o facto das pessoas não se reverem na forma como as coisas esta a ser feitas”, afirma a presidente do congresso.

Como já escrevi anteriormente, os jornalistas precisam de tomar nas suas mãos o destino da profissão. Não se pretende lançar uma guerra contra os grandes grupos económicos (nem contra ninguém, já agora) mas, convenhamos, como as coisas estão, dificilmente será possível fazer grandes mudanças.

As soluções dos grupos de media têm passado por emagrecer as redações, reduzir salários, despedir jornalistas seniores, com bagagem, para os substituir por estagiários que chegam às redações e se deparam com um cenário que prima pela ausência de exemplos a seguir.

Ainda está por explicar como se fez desaparecer o Diário Económico, um título líder e, nada subtilmente, ocupar esse espaço com outro semelhante, com a mesma mão de obra, com os salários reduzidos numa base de aceita quem quer!

E explicar o encerramento de um canal de televisão, a Económico TV, como se não se tivesse passado nada. Será que os media, os jornalistas, conseguem perceber que fazer um última hora com a palavra do ano (geringonça) é pouco relevante, pouco importa para a vida das pessoas, para a própria profissão, ao contrário do encerramento de um canal de televisão, de um órgão de comunicação social?

Os cortes têm-se sucedido nos principais jornais nacionais, no tradicional papel, que, devido à perda de novidade, de valor acrescentado, reduzem leitores como um rio onde foi construída uma barragem. É preciso abrir as torneiras e deixar jorrar o jornalismo sério. A questão que se impõe é: quem paga?

Aposta digital

Aquilo que o futuro apresenta, e quase incontornável, é o mercado digital, os sites de “notícias” para onde os anunciantes têm desviado os investimentos. Leia-se, a única fonte de receita porque os leitores foram habituados a ter conteúdo gratuito ao mesmo tempo que exigem bloqueadores de publicidade.

Estas redações, limitam-se a replicar uma mentira sem medo de represálias. Porque elas não existem. É aquilo a que chamo a Era da Fobia do Clique (EFC).

Como os grandes títulos, os próprios jornalistas seniores, resistiram até à última a esta passagem para o digital, abriram espaço para o surgimento de novos títulos, exclusivos da Internet, gratuitos, com estratégias focadas na pageview, no clique a troco de dinheiro. E tem rendido!

Redações de “picadores”, estagiários, começantes, muitos deles sem formação em jornalismo, sem o mínimo interesse pela deontologia da profissão, a replicar “notícias” que apanham nas redes sociais, que copiam de outros meios.

Criam títulos sonantes, que apelam à emoção e que, muitas vezes, demasiadas vezes, nem sequer correspondem à verdade. Estas redações, limitam-se a replicar uma mentira sem medo de represálias. Porque elas não existem. O pior é que até os grandes nomes da comunicação social, aqueles que antes seriam considerados como “Referência”, caem no mesmo erro.

A ordem dos diretores é rapidez, “temos de ser os primeiros”, sem colocar na frente dos interesses jornalísticos, da credibilidade do próprio órgão de comunicação social, a confirmação de factos. Se a “coisa” é viral nas redes sociais, todos vão atrás, todos replicam, poucos, ou nenhum, tentam confirmar se “aquilo” é notícia ou apenas mais um embuste. Não há tempo. Muitos destes novos jornalistas, nem sequer sabem o que fazer quando alguém lhes diz para ligar a uma fonte.

Os anunciantes, serão bem-vindos, mas anunciam se querem estar associados a conteúdo credível, com leitores atentos, e não porque haverá “notícias” favoráveis.

Aquilo que se passou em dezembro, com a história do Pai Natal, merece apenas uma questão: será que os jornalistas deviam acreditar que ele existe? Para que fique claro, este é o exemplo de uma mentira, transformada em notícia…

Mais uma vez, não atento contra os estagiários. Todos têm de passar por isso. A culpa é de quem está acima. Ninguém confirma, ninguém questiona, ninguém duvida, ninguém acompanha.

Desde que o diretor, ou administrador, esteja a ver o número de cliques no seu dashboard a subir, tudo está bem. Porque quem paga, também tem ligado pouco à qualidade ou veracidade. Pagam contra apresentação de uma folha de Excel com relatórios bonitos, cheios de números que permitem justificar os investimentos feitos em publicidade.

Ou, como tem sucedido em inúmeros casos, recorrem a especialistas em redes sociais que apresentam “truques” para aumentar e monetizar a audiência do Facebook, Linkedin e outras plataformas. A título de curiosidade, qualidade do conteúdo é a chave-mestra. Não são precisos segredos de mago.

Se estas estratégias fazem com que os números sejam mais bonitos no Facebook, sem dúvida, mas será isso que o jornalismo precisa?

Assumir a profissão

Nos moldes atuais, é preciso uma volta de 180º. Os jornalistas têm de assumir a profissão, de se unir.

É isto que se pretende com o Faktual e, como disse anteriormente, apesar de ter lançado este projeto, ele apenas vive se houver jornalistas que queiram associar-se, a fazer mais do que lamentar-se pela queda da profissão. Não se pretende que este projeto seja o bastião do profissão, antes um espaço de união, onde se faz jornalismo de análise.

Factos, investigação, análise, profundidade, clareza. Estes são cinco dos pilares da fundação do Faktual.

Claro, será quase impossível fechar este projeto à publicidade. Os anunciantes, serão bem-vindos, mas anunciam se querem estar associados a conteúdo credível, com leitores atentos, e não por qualquer outra razão.

No Faktual, os artigos serão publicados sem medo de perder um anunciante, desde que se trate de factos, de conteúdo relevante para a vida das pessoas.

E, nesta altura, podem perguntar, o que tem o Congresso dos Jornalistas a ver com o Faktual? Não tem nada e tem tudo. Como comecei por dizer, é preciso mais do que um espaço onde os jornalistas se vão lamuriar, constatar aquilo que já se sabe há alguns anos.

Esse tempo já passou. Já não adianta dizer que a culpa é dos CEO’s dos grupos de media, porque esses, podem ter a certeza, dificilmente vão encontrar receitas para pagar salários mais altos ou manter redações seniores.

Não basta exibir uma faixa a reclamar o quarto poder, é preciso assumir a responsabilidade que esse título acarreta.

É de louvar o esforço de quem teve a iniciativa e tem trabalhado para conseguir colocar este evento de pé. Mas é crucial que os jornalistas percebam que é preciso unir a classe. Deixar de lado as esquerdas e direitas, os amigos, os seguidismos.

Um jornalista é uma pessoa, tem gostos, o direito democrático de optar livremente por ideologias políticas ou desportivas, desde que isso não interfira com a sua independência na escrita de factos.

desafio está lançado a todos os jornalistas que queiram subir a bordo do Faktual. Já agora, convém participar neste congresso para elevar as vozes que podem fazer a diferença.